Entre janeiro e agosto deste ano foram registradas 670 notificações, número mais de três vezes superior à quantidade de casos apurados no mesmo período do ano passado.

Em 21 de setembro é celebrado o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, data oficializada em 2005 pela Lei nº 11.133 para celebrar os direitos e conquistas e enfatizar a importância da inclusão social das pessoas com deficiência. Porém, os números mostram que a violência contra essas pessoas ainda é realidade no Brasil. No Serviço Jurídico Social que oferecemos no Instituto Jô Clemente, o número de notificações de casos de violência ou violação de direitos contra pessoas com deficiência intelectual apoiadas nos diversos serviços oferecidos pela Organização triplicou de janeiro a agosto de 2021 na comparação com o mesmo período do ano anterior. Os dados mostram que em 2020 houve 104 novos casos e 101 retornos de casos em andamento, totalizando 205 notificações. Já neste ano, foram 231 novos casos e 439 retornos, somando 670 atendimentos.

Os dados mostram ainda que antes da pandemia os números já estavam em um patamar bastante elevado. Entre janeiro e agosto de 2019, registramos 1.080 notificações de violência ou violação de direitos contra pessoas com deficiência intelectual, sendo 317 casos novos e 763 retornos.

Serviço Jurídico Social acompanha casos de violência e violação de direitos de pessoas com deficiência intelectual de todas as idades.

“Esses registros mostram que o isolamento social mais rígido no início da pandemia dificultou a verificação de casos suspeitos ou confirmados de violência ou violação de direitos contra pessoas com deficiência intelectual, o que causou uma subnotificação. Este ano, com a flexibilização gradual das regras de quarentena, os números voltaram a subir, o que é preocupante, pois mostra que ainda existe muita violência contra esse grupo na sociedade”, afirma Luciana Stocco, supervisora do Serviço Jurídico Social.

Segundo ela,“a pandemia tirou as pessoas com deficiência intelectual e/ou outras deficiências da escola, do trabalho e de outros lugares que costumavam frequentar, pela necessidade de ficarem em casa. Com isso, muitos casos de violência que acontecem em casa, por exemplo, não foram observados por professores, psicólogos, colegas, entre outros grupos. Muitas vezes, as denúncias surgem após observação de pessoas com as quais elas convivem fora de casa. Sem essa convivência, a violência continua acontecendo, mas não é notada”.

Ainda de acordo com Luciana, logo no início da pandemia, os atendimentos do IJC passaram a ser realizados remotamente. “Atualmente, a maior parte já é presencial e é no contato pessoal, na observação e nas orientações que sinais de que algum tipo de violência está sendo vivenciada pela pessoa com deficiência ou algum familiar podem ser detectados com mais profundidade, por meio de uma abordagem com psicólogos e assistentes sociais, que avaliam a situação no âmbito psicossocial”, comenta.

Em muitas dessas denúncias, a vítima não é apenas a pessoa com deficiência, mas sim algum familiar que convive com ela e tenta protegê-la, como a mãe, por exemplo, vítima de violência doméstica. Quando isso acontece, o IJC apura e encaminha os casos para as redes de proteção, como os Centros de Defesa e Convivência da Mulher e as Delegacias da Mulher. A psicóloga Ticiana Pedroso, que atua na equipe de atendimento do Serviço Jurídico Social, afirma que “parte da população acredita que a violência só acontece quando deixa marcas, mas não é só isso. Violência é toda forma de agressão, seja psicológica, patrimonial, sexual, física ou violação de direitos humanos. Quando falamos em pessoas com deficiência intelectual, não podemos esquecer que o ambiente familiar, o mesmo que promove o cuidado, pode por vezes propiciar situações de violências tanto a essas pessoas quanto aos cuidadores, devido à ausência de uma política de cuidado, o que acaba sobrecarregando a família”.